Imagem: Marcelo Ferreira
Uma pesquisa inédita realizada pelo Centro das Mulheres do Cabo (CMC) oferece elementos para melhor entender o fenômeno da evasão escolar na rede pública de ensino de uma das cidades mais populosas do Litoral Sul de Pernambuco. Intitulada “Diagnóstico Participativo sobre a Evasão Escolar das Meninas e Jovens Mulheres do Cabo de Santo Agostinho (PE)”, o estudo, que contou com apoio do Fundo Malala, traça o perfil das adolescentes e jovens mulheres fora da escola, mostrando as causas e os impactos da evasão escolar na sociedade apontando caminhos para lidar com o problema histórico na educação brasileira.
De acordo com a pesquisa, um dos principais motivos do abandono escolar nos últimos dois anos está relacionado com a pandemia da Covid-19. Cerca de 38% das entrevistadas informaram que deixaram de estudar por falta de acesso à internet, o que as impediu de acompanhar as aulas virtualmente. A gravidez precoce, também aparece entre as principais causas de abandono escolar. Outro dado levantado mostrou que, das meninas entrevistadas, 14,6% tiveram de trabalhar para gerar renda para suas próprias subsistência e de seus familiares. A interrupção das aulas presenciais foi avaliada como muita negativa pelas meninas: 95,2% delas desejam voltar às aulas presenciais. Para 40% das entrevistadas, as escolas não ofereceram a estrutura necessária para garantir segurança sanitária no contexto de pandemia.
“As meninas e jovens mulheres sofreram mais do que os meninos e rapazes jovens na pandemia, porque o trabalho doméstico, de cuidar da casa e das pessoas idosas, com deficiência ou doentes, recai sobretudo sobre as mulheres que estavam em casa. Ou seja, a pressão em cima dessas meninas e jovens mulheres foi muito maior, impactando negativamente o seu desempenho escolar e levando muitas delas a abandonarem a escola”, explica a integrante da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala no Brasil, Cássia Jane, que coordenou a pesquisa aplicada nos diversos bairros do município de Cabo de Santo Agostinho, na Região Metropolitana do Recife.
Das 96 meninas e jovens entrevistadas, 72,9% residem em oito bairros e comunidades de Cabo de Santo Agostinho: Vila Claudete, Bairro São Francisco, Nova Tatuoca, Gaibu, Engenho Mercês, Enseadas do Corais, Alto da Bela Vista e Cidade Garapu. A pesquisa também foi realizada com os/as gestores/as das escolas públicas, profissionais de saúde e conselheiros/as tutelares.
O diagnóstico, protagonizado e aplicado por meninas e jovens mulheres cabenses, é parte do projeto “Meninas em Movimento pela Educação”, desenvolvido pelo Centro das Mulheres do Cabo com o apoio do Fundo Malala. O projeto dá suporte a cerca de 90 meninas para atuarem como ativistas por melhores condições nas escolas públicas em que estudam e a se engajarem na promoção da igualdade de gênero no ambiente escolar. Entre os objetivos do projeto estão identificar as causas e combater a evasão escolar, além de implementar um plano para aprimorar as políticas públicas relacionadas à promoção do direito à educação de meninas e jovens mulheres do município, com foco em igualdade de gênero e raça.
Pesquisas globais do Fundo Malalala mostram que o aumento das taxas de pobreza, responsabilidades domésticas, trabalho infantil e gravidez na adolescência afetaram desproporcionalmente a capacidade das meninas de aprender durante a pandemia, impedindo o retorno delas à escola. Uma realidade que foi confirmada na cidade do Cabo de Santo Agostinho. “A pesquisa foi realizada para gente fazer uma análise desse contexto para identificar quais os fatores que levam as meninas a abandonarem a escola para nos ajudar a criar um plano de enfrentamento à evasão escolar mais real e concreto. Agora, a gente tem um norteador para esse plano. Estamos fortalecendo a parceria com o poder público através das Secretarias municipais de Educação, da Mulher, Saúde e de Programas Sociais, além da sociedade civil por meio de um comitê gestor que vai ajudar na elaboração do plano de incidência e enfretamento à evasão escolar”, pontua Cássia Jane.
Sobre a Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala
Inspirado pelas raízes de Malala e Ziauddin Yousafzai como ativistas locais no Paquistão, o Fundo Malala estabeleceu em 2017 a Rede de Ativistas pela Educação (Education Champion Network) para investir, apoiar o desenvolvimento profissional e dar visibilidade ao trabalho de mais de 80 educadores de oito países que trabalham a nível local, nacional e global em defesa de mais recursos e mudanças políticas necessárias para garantir educação secundária a todas as meninas. O Fundo Malala apoia educadores no Afeganistão, Brasil, Etiópia, Índia, Líbano, Nigéria, Paquistão e Turquia. No Brasil, a Rede é formada por 11 educadoras e educadores, que atuam em organizações dedicadas a construir esforços coletivos pela educação escolar de qualidade nas regiões do país onde a maioria das meninas não frequenta o ensino secundário, com foco em meninas negras, indígenas e quilombolas.
Acesse a pesquisa na íntegra: