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Cendhec apresenta pesquisa sobre desigualdades de gênero na Educação

| 15 de novembro de 2022
Das meninas entrevistadas em Igarassu, Recife e Camaragibe, 59,1% responderam não saber o que é desigualdade de gênero

Uma pesquisa desenvolvida pelo Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (Cendhec), com apoio do Fundo Malala, buscou entender os efeitos das desigualdades de gênero na vida escolar de meninas. Realizada com 438 estudantes do ensino fundamental II das redes de ensino municipal público do Recife, Camaragibe e Igarassu, o levantamento compõe uma das ações do projeto Na Trilha da Educação. Gênero e Políticas Públicas para Meninas e mostrou que 94% das estudantes ouvidas querem que o tema da igualdade de gênero seja discutido nas escolas. 

Racismo, assédio, LGBTQIA+fobia, trabalho doméstico e falta de incentivo para a prática de atividades esportivas são alguns dos problemas apontados pelas adolescentes. Os primeiros resultados da pesquisa, encabeçada pela entidade que há 33 anos trabalha na defesa e promoção de direitos humanos, serão apresentados e destrinchados durante o seminário “Meninas por uma Educação com Igualdade”, que acontece no dia 16 de novembro no auditório Dom Helder Camara, Bloco A, na Universidade Católica de Pernambuco. O encontro reúne educadoras/es; estudantes; representantes das secretarias municipais e gestões escolares das cidades parceiras do Cendhec. 

Realizada entre os meses de março a setembro de 2022, a pesquisa foi dividida em dois métodos: quantitativo – por meio da aplicação de questionários;  e qualitativo – através da formação de grupos focais. As adolescentes consultadas responderam ao questionário no método quantitativo; gestoras/es e professoras/es também foram ouvidos/as durante o estudo. Já no método qualitativo, um grupo de 71 meninas participou de rodas de discussão sobre desigualdade de gênero e educação, sendo 35 estudantes matriculadas no fundamental II e 36 jovens que estão fora da sala de aula, com até 21 anos. Mães de estudantes também foram entrevistadas. 

Pedagoga do Cendhec, Paula Ferreira é integrante da Rede de Ativistas pela Educação do Fundo Malala (Rede Malala) e também atuou na mobilização da pesquisa. A ativista acredita que o enfrentamento às desigualdades de gênero é um desafio que precisa ser encarado pelas secretarias de educação e gestões escolares. “Vivemos em uma sociedade estruturada pelo machismo e isso faz com que muitas meninas enfrentem barreiras na escola. Para combater as desigualdades de gênero no ambiente escolar é preciso que as três redes parceiras do Cendhec, e que participaram da pesquisa, possam pensar em ações e projetos para garantir uma educação mais inclusiva para meninas, principalmente negras e que estão em vulnerabilidade social. Esse levantamento oferece dados importantes para pensar nas melhores estratégias”, diz. 

Uma educação não sexista orienta-se pelo que dispõe a Resolução 34/180 da Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), de 18 de dezembro de 1979, a qual se coloca a favor das “mesmas condições de orientação profissional, de acesso aos estudos e de obtenção de diplomas nos estabelecimentos de ensino de todas as categorias”. O documento propõe também a “eliminação de qualquer concepção estereotipada dos papéis masculino e feminino em todos os níveis”.

Rebecca Andressa, de 14 anos, estudante da rede municipal do Recife, tem a resposta na ponta da língua quando o assunto é a educação que ela quer.  “Uma escola que tenha igualdade para meninos e meninas é uma escola que apoia não só os meninos, mas também as meninas para que elas tenham sua voz ouvida. Tem muitas desigualdades na escola e precisamos de mais respeito, não só na escola como em qualquer lugar”. 

Coordenadora do Programa da Criança e do Adolescente e coordenadora adjunta da instituição, a cientista social Katia Pintor pontua que a pesquisa considerou aspectos como classe, raça e gênero.  “Ouvir as meninas ajuda o Cendhec a ter elementos para fazer com que essas vozes sejam ecoadas e transformadas em ação, em políticas públicas que garantam direitos previstos na Constituição de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Essa pesquisa é muito importante para que o trabalho do nosso centro de defesa siga cada vez mais fundamentado”. Além da apresentação dos resultados, durante o seminário o Cendhec entregará às secretarias de Educação uma carta de recomendações produzida pelo centro, a partir da experiência do projeto. 

45,9% das entrevistadas têm 12 anos, 78% das entrevistadas são negras e pardas, 41% são evangélicas e 19,9% são católicas (60% cristãs).


PRINCIPAIS DADOS
Perfil das estudantes ouvidas: 45,9% das entrevistadas têm 12 anos, 78% das entrevistadas são negras e pardas, 41% são evangélicas e 19,9% são católicas (60% cristãs).

Desigualdade de gênero: 
Das meninas entrevistadas em Igarassu, Recife e Camaragibe, 59,1% responderam não saber o que é desigualdade de gênero, ao mesmo tempo, 66% acham que meninas e meninos não têm os mesmos direitos na escola. Sete em cada dez afirmam que seus professores não discutem o tema, porém 94,1% apontam que debater direitos de meninas e meninos é necessário.

Falta de incentivo afasta meninas das atividades esportivas: 
Aproximadamente 60% das estudantes acreditam que existe preconceito em relação às meninas praticarem esportes. Segundo elas, este preconceito é demonstrado pelos meninos, que foram citados em 91,5% das respostas. Um percentual de 26,5% das estudantes afirmaram se sentirem desconfortáveis com comentários sobre suas roupas. 

Assédio na escola: 
A pesquisa apresenta que 31,5% (sendo 7,1% muitas vezes + 24,4% algumas vezes) já se sentiu incomodada com atitudes/comentários de meninos. Dessas, 54,4% (sendo 11,9% muitas vezes +  42,5% algumas vezes) sentiu que havia maldade, segundas intenções. 53,8% não contou pra ninguém sobre essas atitudes. Racismo: Uma a cada 4 meninas sofre preconceito em ambiente escolar. De acordo com o levantamento, 26,9% das meninas entrevistadas dizem terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento/repúdio em suas instituições de ensino. Das vítimas, 38,1% atribui a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11,0% por ser negra.

Racismo:
Uma a cada 4 meninas sofre preconceito em ambiente escolar. De acordo com o levantamento, 26,9% das meninas entrevistadas dizem terem sido afetadas por algum tipo de prejulgamento/repúdio em suas instituições de ensino. Das vítimas, 38,1% atribui a ação ao racismo: 27,1% por ter cabelo crespo/enrolado; 11,0% por ser negra; 

Saúde mental, educação e pandemia: 
Quase metade das meninas em idade escolar se queixam de ansiedade. A pesquisa apresenta que a maioria (48,9%) das meninas entrevistadas se diz, na maior parte do tempo, ansiosa. Ao todo, 68,3% das consultadas sentiram que a pandemia afetou sua saúde emocional, 65,9% disseram que a tristeza as abalou no período, outras 27,8% conviviam com o medo de perder alguém. Sem aulas presenciais, o desenvolvimento delas também sofreu um duro golpe. Os números mostram que 55,5% das meninas relataram ter dificuldades para participar de aulas remotas, 43,2% destas atribuíram à dificuldade de acesso à internet. Ainda segundo o levantamento, 48,2% afirmam ter percebido prejuízos importantes em sua aprendizagem durante a crise sanitária.

Sobre o Na Trilha da Educação. Gênero e Políticas Públicas para Meninas
O projeto tem entre as suas principais premissas: educação como direito fundamental; escola como espaço de proteção para garantia dos direitos das crianças e adolescentes; e direitos iguais para meninas e meninos independente de cor, raça, classe social, identidade de gênero ou religião. Além de incidência política, ao longo de dois anos, “Na trilha da Educação” promoveu formações, ações de comunicação para disseminar as pautas de enfrentamento às desigualdades de gênero e a articulação da rede de proteção. Desenvolvida desde 2020 pelo Cendhec, a iniciativa conta com apoio do Fundo Malala e tem como objetivo contribuir com a formulação de políticas que promovam o enfrentamento às desigualdades de gênero na educação pública para promover a autonomia e o desenvolvimento integral das meninas. 

“A pesquisa é uma ferramenta muito importante para conhecer os problemas que as meninas enfrentam nas escolas. A partir desses dados e informações, o poder público pode elaborar estratégias e políticas que garantam a equidade de gênero nas escolas”, diz Maíra Martins, representante do Fundo Malala no Brasil. A Rede de Ativistas pela Educação, estabelecida pelo Fundo, tem o objetivo de investir, apoiar e dar visibilidade ao trabalho de ativistas pela causa em dez países: Afeganistão, Bangladesh, Brasil, Etiópia, Índia, Líbano, Nigéria, Paquistão, Tanzânia e Turquia. No Brasil, a Rede Malala conta com 11 integrantes e suas organizações, incluindo Paula Ferreira, do Cendhec.  

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